Rogério Rosso, considerado como um dos herdeiros políticos de Joaquim Roriz, dá entrevista em que fala de sua relação com a família Roriz, dos seus planos a partir de 2011 e da possibilidade de se candidatar ao GDF em 2014 com apoio rorizista.


Confira entrevista exclusiva com Rogério Rosso

Fabio Grecchi e Maria Eugênia
redacao@jornaldebrasilia.com.br

Na varanda de sua casa, no Lago Sul, onde prefere despachar, o governador Rogério Rosso (PMDB) recebeu o Jornal de Brasília para falar o que fez até agora e quais são seus planos para 2011. À frente da transição para o governo do petista Agnelo Queiroz, que tem como vice Tadeu Filippelli (PMDB), Rosso conta que apoiou Weslian Roriz (PSC) "porque não é ingrato" e faz questão de lembrar que, naquela ocasião, as pesquisas mostravam que ela estava bem atrás: "Se pensasse em mim, no meu futuro político, seria mais fácil ter apoiado o Agnelo ou ficado neutro." Questionado se seria ele o herdeiro político dos votos dados a Roriz, o governador diz que a transferência não é natural e que é preciso conquistar os eleitores. Mesmo depois das eleições, ele ainda insiste em dizer que o PMDB deveria ter saído com candidatura própria, com Filippelli encabeçando a chapa, já que 500 mil votos não foram dados a nenhum candidato (brancos, nulos e abstenção), o que significa quase 30% do eleitorado. Neste conversa, ele mostra ainda os feitos de seu governo e se considera um governador-interventor, pois preferiu "fazer a gestão da crise e trabalhar pensando no futuro da cidade."


Esse processo de transição parece ter se tornado especial para o senhor...
Com certeza. Quando nós assumimos, a transição correu na velocidade da luz. Nós assumimos um trem andando, no escuro e sem maquinista. Tivemos que, ao mesmo tempo, garantir os serviços essenciais à população e fazer uma radiografia para sabermos o que planejar, para tomar decisões.

Foi difícil?
Muito... até que a gente tomasse pé de todo esse conjunto enorme de obras que estava sendo feito na cidade, até você saber a situação de cada uma, se foram regularmente contratadas, se tinha disponibilidade orçamentária, financeira, se estava empenhado ou não, se tinha licenciamento ambiental, se tem pendência estrutural. Para saber tudo isso eu criei alguns comitês para áreas prioritárias. E antes do primeiro turno das eleições, baixei decreto estabelecendo, pelo lado do GDF, algumas regras para a transição, independentemente de quem fosse eleito.

Por que tanto cuidado?
Justamente para mostrar, a quem saísse vencedor, a nossa disposição de fazer uma transição transparente. A ideia era começar a levantar e deixar para quem viesse a maior quantidade de informações disponível. Isso vai permitir que o próximo governador entre em 2011 com o pé no acelerador. E nós não queremos que o Agnelo passe pelo que passamos, de não ter informação, de ter que fazer uma radiografia rápida e ao mesmo tempo governar.

O senhor se considera mais um governador ou um interventor?
Os dois e, ao mesmo tempo, nenhum. Tivemos que tomar medidas como interventor, como auditorias nos contratos e procedimentos. Na área de Saúde, por exemplo, tivemos que reverter a lógica de abastecimento que vinha funcionando. Na verdade, se esperava acabar o medicamento, o material, para solicitar uma compra emergencial. Ou seja, mais caro e em baixo estoque. Só para aquele momento. Hoje, com planejamento, teremos até o final do ano uma economia de R$ 400 milhões. Isso vai ficar para o próximo governo. Nós, pegamos a rede totalmente desabastecida. Esse exemplo eu posso replicar em várias áreas. Então, me considero um governador-interventor.

Com relação ao orçamento, aliás, vocês estão com problemas...
É, nós pegamos um orçamento superestimado em detrimento da receita real. A Lei Orçamentária de 2010 foi superestimada, incompatível com a receita. Portanto, é regra da boa gestão fiscal contingenciar aquilo que não existe.

Esse dinheiro, então, não está aplicado. Ele não existe?
Temos que ter bem a clareza do que é orçamentário e do que é financeiro. Se eu coloco uma proposta orçamentária, com todos os programas e projetos de cada unidade, mas se o financeiro não é suficiente para executar tudo, como é que você vai fazer? Tem que se tomar alguma providência, de contingenciar, inclusive, a receita.

O senhor pode dar um exemplo?
O passe livre estudantil, que estava consumindo R$ 10 milhões por mês, enquanto no orçamento estava previsto uma despesa de R$ 16 milhões por ano. Tinha que tirar de algum lugar. Esse é um exemplo clássico de problema orçamentário, que conosco foi desde a manutenção do metrô, dos programas sociais, obras, manutenção de custeio de empresas estatais, pagamento de servidor. Portanto, o orçamento vigente foi, no mínimo, incompatível com as ações e programas do governo, o que nos obrigou a colocar um pé no freio e trabalhar com uma realidade. E o orçamento que nós elaboramos para 2011, vocês podem ter a absoluta certeza, está com o pé na realidade. Só na Saúde, ele está R$ 1 bilhão maior do que o deste ano, quase 30% a mais...

A transparência que o senhor decidiu adotar em relação à transição está relacionada ao fato de não deixar brechas para que o próximo governo o acuse de ter deixado uma herança maldita?
Não. É de mostrar a verdade. Eu não contingenciei o orçamento agora. Eu fiz quando eu entrei, em abril. Eu não determinei auditorias nos contratos agora. fiz quando eu assumi. Então, a decisão de fazer uma transição transparente é em homenagem à população. Ao contrário, a herança maldita orçamentária já existe, estamos convivendo com ela desde o início do nosso governo, que ainda precisou bancar despesas com servidores que não estavam previstas, porque a folha salarial do GDF teve um aumento no primeiro trimestre do ano de R$ 200 milhões. E tivemos que tirar de outro lugar. A minha preocupação é dar ao Agnelo condições para que ele tome as decisões acertadas e rápidas.

A pergunta foi porque no jogo político, quando as coisas começam a não dar certo, é mais fácil jogar a culpa no anterior...
Eu entendo a sua pergunta. Mas eu jamais fiz alarde em relação às coisas erradas que descobrimos aqui, aos problemas gravíssimos das obras paralisadas, à falta de planejamento em diversas áreas, escolhas equivocadas, na minha avaliação, como no caso do Hospital de Santa Maria. Eu não fiz isso, até porque esse não era o meu papel. O meu papel era de fazer com que a cidade continuasse na sua normalidade. Que a gente desse uma injeção de correição e de auditagem em todas as áreas de governo e garantíssemos a prestação do serviço em todas as áreas. Realmente, seria mais fácil empurrar esses problemas para debaixo do tapete. E foi uma decisão que nós tomamos em conjunto. Decidimos enfrentar. Eu poderia muito bem mandar os créditos para a Fácil do passe estudantil e ele consumir R$ 200 milhões esse ano. Mas preferimos mudar a lei, as regras do passe livre. Renegociamos contratos. Preferimos fazer a gestão da crise e trabalhar pensando no futuro da cidade.

Quais foram outras decisões do seu governo?
Teve a questão do Buritinga, por exemplo, que eu vi que o Agnelo vai continuar. Tomamos a decisão de devolver tudo para a Polícia Militar porque o local não servia para ser sede de um governo. E lá tinham milhares de servidores do GDF. Agora, só ficou um pedacinho da Secretaria de Justiça, que devemos retirar de lá até o final de dezembro. A questão do Hospital de Santa Maria. O contrato prevê um custeio de R$ 12 milhões por mês, o que representa quase 15% de quase todo o gasto com a rede. O contrato com o Hospital de Santa Maria foi muito mal feito, ao ponto de o GDF ter que entrar na Justiça para obrigar o atendimento à população.

Nesses contratos mal feitos o senhor detectou má-fé?
Olha, nós detectamos que talvez tivesse havido pressa. O emergencial, por exemplo, não pode virar padrão como virou para várias áreas. Eu só fiz uma compra emergencial até agora. Foi para a KPC, mesmo assim com autorização do Ministério Público por escrito. São procedimentos que nós adotamos e que deveriam ser mantidos. Muitas obras nós entregamos, e não fizemos nada. Nem sequer estive presente. Foi uma opção que fizemos para dar o exemplo à maquina do GDF, que ela tem de trabalhar para a sociedade e não para A ou B.

O senhor disse que faltou dinheiro para pagar a folha de pessoal. Mas, mesmo assim, chamou muitos concursados...
Chamei aqueles cujos concursos estavam vigentes e havia previsão orçamentária. Chamei porque eu entendo que quanto mais servidor público concursado, no lugar daqueles outros terceirizados, melhor. Inclusive, mais barato. É uma linha que nós adotamos como política.

O senhor tem algum arrependimento desde que decidiu disputar a eleição indireta?
Não. Mas acho que só tem noção da complexidade do que é um governo como o do Distrito Federal quem o está exercendo. Em condições normais já é um grande desafio governar uma cidade-Estado. Nas condições que nós recebemos foi um grande desafio. Eu não tenho arrependimento, até porque eu diria que foi um privilégio poder ajudar Brasília nesse momento.

Que desafios foram os maiores até agora?
Foram vários, como a área de Saúde Pública. Teve a questão do transporte, principalmente no que diz respeito à tarifa de ônibus. Travamos uma verdadeira batalha. Foram quatro anos sem aumento de tarifa, o que fez com que a pressão fosse muito grande, tanto das empresas quanto das cooperativas. Nos outros estados, tudo isso é planejado. Você tem, a cada ano, um aumento previamente estipulado, com base em índices oficiais. Aqui me parece que foram adotadas algumas medidas ao longo dos últimos anos visando uma eleição ou reeleição. Isso atrapalhou demais.

Por falar em arrependimento, o senhor se arrepende de ter apoiado Weslian Roriz?
Não, porque eu não sou ingrato. No domingo, quando teve a decisão da substituição da candidatura de Joaquim Roriz pela a de dona Weslian, eu fiz questão de ir na casa dela, no meu carro, eu dirigindo, prestar a ela o meu apoio pessoal. Afinal, foi ela uma das grandes incentivadoras para que eu ingressasse na vida pública. Eu trabalhava no setor privado, e ela e a Liliane (a filha mais nova do casal Roriz), madrinha do meu filho, comadre da minha esposa, minha comadre... Não tenho qualquer arrependimento. Sabia desde o início as dificuldades que isso poderia criar. Ela já estava em desvantagem, segundo as pesquisas. Seria muito mais fácil eu ter escolhido apoiar o Agnelo ou ficar neutro, se eu estivesse pensando em mim, em algum espaço político futuro. Mas, no momento que ela foi lançada, eu não poderia ter deixado de fazer o que eu fiz.

O senhor chegou a ser acusado de usar a máquina pública a favor da candidatura Roriz. Isso ocorreu?
Não. Ao longo de todo o processo a máquina não foi utilizada. Secretários e administradores que tinham preferência pelo candidato Agnelo não sofreram qualquer tipo de retaliação. A única coisa que não podia ser feito era a usar a máquina, era fazer campanha durante o horário de serviço. Não liguei e não pedi voto para ninguém do governo. Repito: foi uma decisão minha e pessoal.

O senhor acredita que por conta dessa estreita relação que tem com a família Roriz, para 2014 ...
2014 está muito longe...

... mas o senhor pode vir turbinado por eles num eventual processo eleitoral? O senhor trabalha para isso?
Hoje, eu trabalho para governar o Distrito Federal e fazer uma transição da qual, amanhã, todos nós possamos nos orgulhar por ter contribuído para uma normalidade no Distrito Federal...

... o senhor tem um futuro político...
As urnas mostraram que um terço da cidade tem uma fidelidade enorme ao governador Roriz, até pelo seu histórico de 14 anos de governo. Mas a identificação dessa população com uma nova liderança depende do trabalho do político, da pessoa que vai estar trabalhando. Na minha avaliação, não é de cima para baixo. É do eleitor para o político. Isso é um processo. Vamos relembrar que eu tentei fazer com que o PMDB lançasse uma chapa própria. Inclusive tendo o Tadeu Filippelli como cabeça de chapa. Porque ele sinalizava dentro do processo eleitoral que isso seria possível. Se a aliança PT-PMDB estivesse totalmente consolidada no momento da eleição indireta, da qual eu sai vencedor, teria se feito uma chapa PT-PMDB. Mas o PT fez a sua chapa, o PTB fez a sua, o PR e o PMDB fez a sua chapa também. Então a minha percepção é que existia um espaço no eleitorado para uma outra chapa. Talvez eu não estivesse tão enganado assim, porque foram 500 mil votos que foram brancos, nulos ou fruto da abstenção. Quinhentos mil votos num total de um milhão e oitocentos é muita coisa. Quase um terço dos votos não foi para ninguém. E é isso que eu procurei fazer, demonstrar ao PMDB.

O PMDB ficou pequeno para o senhor? Como será a sua relação com o partido agora?
Não. O PMDB é o maior partido do Brasil. Eu nunca tive outro partido que não fosse o PMDB, onde entrei em 2005. Sei que, obviamente, a minha posição não agradou e não agrada a parte do partido. Mas nacionalmente, o PMDB se posicionou de formas diferentes. Uma parte apoiava a Dilma, parte não apoiava. Outra parte apoiava a Marina Silva, parte não apoiava ninguém. Isso mostra que o partido é democrático, não déspota. Mas eu não penso partidariamente hoje. Hoje eu penso no Distrito Federal, e na sua população. A questão partidária, do que o PMDB pensa, é coisa do PMDB. Penso, então, só focar na governo, na cidade e na transição.

O senhor veio da iniciativa privada e parece que gostou muito da vida pública...
É totalmente diferente. Eu trabalhei em várias montadoras de automóveis. No início do mês você já sabe que tem de vender tantos carros, e todos os dias você tem um cronograma de acompanhamento e toda a estrutura da empresa trabalha para aquilo: vender o automóvel, gerar o lucro, pagar o salários dos empregados, para se perpetuar, para lançar novos produtos... No governo é diferente. Você precisa ser ágil, mas dentro da legislação que envolve tudo. Se você vai fazer uma obra, você tem que fazer o projeto, licitar, tem que ter as licenças ambientais. As coisas são naturalmente mais demoradas. No setor privado o objetivo é o lucro, no governo é a satisfação do serviço prestado. Mas é possível implementar um ritmo bom no governo, desde que você monte uma equipe que conheça profundamente a máquina; desde que você faça projetos que não serão questionados pelo Tribunal de Contas ou pela Justiça.

Falou-se muito sobre a sua discrição. Para alguns pareceu até pouco envolvimento. O senhor poderia falar um pouco disso?
Olha, no setor privado a gente trabalha muito em equipe. E eu trouxe isso aqui para o GDF. É um estilo que eu tenho. Não tomo decisões sozinho, não centralizo. Pelo contrário, até por confiar muito nas pessoas, eu prefiro acompanhar o que está acontecendo, dar as diretrizes maiores, e deixar equipes qualificadas exercerem as suas atividades. Talvez, nem todos tenham entendido isso.

Mas o seu governo não vai tratar só de transição, vai?
Não. Nós temos muitos projetos. Acabamos de protocolar junto ao Governo Federal demandas no valor de R$ 4 bilhões para serem investidos, pelo futuro governo, em mobilidade urbana. Expansão do metrô, ampliação de vias, VLT, VLP... Lançamos a reforma de 20 centros de saúde, obras previstas no orçamento deste ano...

O orçamento elaborado pela sua equipe, então, está aberto?
Estamos totalmente flexíveis. Além disso, ele ainda vai ser votado, vai ser discutido na Câmara, está sendo discutido. Está aberto porque durante a transição do Agnelo eles vão identificar, obviamente, programas que eles querem ter um aporte maior, menor. E o momento de aprovação do orçamento com o da transição se casam. Da nossa parte não seremos intransigentes em nada.

O senhor disse que gosta do planejamento da vida privada e gostou da vida pública. O que será de Rogério Rosso a partir de 1º de janeiro de 2011?
Primeiro, quero ter mais contato com meus filhos, com a minha família. Hoje, pouco eu os vejo. Segundo, quero retomar os meus estudos políticos. Sou advogado, quero me modernizar, aprimorar meu conhecimento em diversas áreas, inclusive em gestão pública. Mas quando, como e onde eu ainda não sei. Quero continuar a compor minhas músicas. Sou da geração de Brasília que, aos 14 anos, o que tinha para fazer era estudar e ir a show de banda de rock ou tocar numa banda de rock. Aí eu optei por tocar. Sou muito melhor músico do que político.

E politicamente?
Politicamente, é impossível você governar uma cidade, ainda mais em um momento como nós pegamos, num ambiente de grande desafio, você não ter atenção pela vida pública. É impossível. A vida política ela permanece, você entende? É normal.

E qual será o caminho que o senhor vai trilhar?
Bom, primeiro preciso de um momento de reflexão. E preciso arrumar um emprego. No setor privado fui assalariado, não sou empresário, sou advogado e preciso ter uma atividade remunerada.

O que o senhor espera do próximo governo?
Eu torço muito que o próximo governo dê atenção aos problemas reais da cidade, que são evidentes, transporte, saúde... Espero que o Agnelo crie, de fato, condições para a cidade. Mandei um projeto de lei para a Câmara que destina os recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) integralmente às regiões administrativas. Que elas ganhem com isso certa autonomia financeira para que, num futuro próximo, elas sejam autônomas administrativamente. Espero que ele dê continuidade a isso. Espero que ele não ignore a questão do Entorno. Não é possível administrar Brasília sem pensar nessa área metropolitana ao seu redor. Afinal, Brasília dorme de um tamanho e acorda de outro, bem maior. Quem ignorar isso vai falhar.

Fonte: Da redação do clicabrasilia.com.br

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